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quarta-feira, março 18, 2009

Jornalismos

Ser jornalista é quase sempre um trabalho sem frutos palpáveis. Inútil na maioria dos dias. Quem sai da escola e chega a uma redacção com vontade de mudar o mundo e fazer grandes reportagens, rapidamente percebe que escolheu o caminho errado.
O jornalista é um grande seleccionador de factos, sejam eles coisas que acontecem ou opiniões de outros, que encaixa quase sempre em espaços muito pequenos de papel ou tempo. Os juízos pessoais são tabu. Até posso achar que o político x é evidentemente para todos uma besta e que a medida y é estapafúrdia, mas não posso dizê-lo.

Há poucos dias usei a ferramenta básica da profissão. Coloquei uma questão: porque são raríssimas as instituições sociais, religiosas ou humanitárias que aderem ao sistema que lhes permite receber uma doação de 0,5% do IRS dos contribuintes? Não faz sentido.
Ao fim de alguns telefonemas concluí que as finanças levavam as instituições a escolher entre essas doações do IRS ou o reembolso do IVA, com um conhecido fiscalista a contestar a legalidade da medida. Era assim desde 2002, mas parece que ninguém se queixava.
Sem grande impacto (já fiz coisas supostamente mais relevantes para os complexos parâmetros mediáticos), a notícia saiu. Como tantas outras, foi para o ar e durante umas horas andou pelas antenas da rádio, até esgotar o natural prazo de validade.
Hoje, o governo decidiu alterar a lei. Se cumprir a promessa, e independentemente da minha opinião sobre o assunto (como já perceberam, não conta...), daqui a umas décadas vou poder dizer aos meus netos que acredito que foi devido a uma simples pergunta minha que instituições que supostamente tentam ajudar outros passaram a receber mais uns milhões de euros do Estado.

Chamem-me convencido (admito), mas hoje sinto-me importante. Dá gozo influenciar o chamado “poder”, é verdade, mas isso é completamente secundário: penso que ajudei alguém e não é todos os dias que sinto isso quando estou a trabalhar. A última vez foi há seis ou sete anos, depois de fazer uma reportagem num bairro municipal de Lisboa sobre problemas antigos nos esgotos. No dia seguinte ligaram-me a agradecer: os técnicos da câmara já tinham resolvido o problema.
Às vezes, vale a pena ser jornalista.

1 Comments:

Blogger Anette said...

E é com estas pequenas vitórias que temos de ir caminhando na profissão. Continua a fazer o bom trabalho que tens feito nessa área, com a clarividência que te é característica. Tu ainda vais ficar para a história, miúdo, se é que já não estás. Tudo a correr bem, estamos em escuta.

5:45 da tarde  

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