Nápoles: o arrebatador (ou destruidor) caos (des)organizado.
Aceleras por todo o lado, a buzinar, num trânsito louco, sem regras escritas, onde carros de bebé atravessam cruzamentos na diagonal à frente de automóveis que parecem achar tudo normal. No passeio, em qualquer canto com mais de um metro quadrado, miúdos correm atrás de uma bola, quase sempre laranja, de plástico e a dizer «Super Santos».
Num parágrafo, apresento-vos Nápoles. Uns detestam-na. Outros amam-na. Se para o primeiro sentimento é fácil encontrar explicações (bastam os assaltos), para o segundo a justificação é difícil.
A cidade não tem espaços verdes. Os horários não servem para nada. O trânsito é caótico. As buzinas não param. Os italianos falam alto demais. Famílias inteiras ocupam motoretas, sem qualquer sentido de (in)segurança. Motociclitas têm amenas cavaqueiras ao telemóvel ou falam calmamente com o companheiro do lado. Em qualquer lado, até a peões, a polícia faz operações stop.
Tudo isto é estranho. Mas tudo isto parece ser a verdadeira Itália, que desapareceu do Norte há muitas décadas atrás.
Pompeia: muita história, muita pedra.
Nápoles-Sícilia: Os comboios impossíveis de alcançar.
San Gimignano: Manhatan medieval. Turistas.
Ancona-Bari: no chão.
Matera: Homens das cavernas. Suor.
Sicília: no barco.
Palermo: máfia sem mafiosos.
Vulcano: onde o mar queima os pés.
Stromboli: longe
«”Onde estamos?”, perguntou meu tio, que pareceu muito irritado por ter voltado à superfície da terra. (…) – “Tentemos o italiano”, retomou, e disse nessa língua: “Dove noi siamo?” Nada de o garoto responder. “Vamos, fale!», gritou o meu tio, que começava a ficar nervoso e sacudia o menino pelas orelhas. “Come si noma questa isola?” “Stromboli”, respondeu o pastorzinho, que escapou das mãos de Hans e correu para a planície dos olivais. O Stromboli! Que impacto esse nome inesperado provocava em minha imaginação! Estávamos em pleno Mediterrâneo, no meio do arquipélago eólio, mitológico, na antiga Stronbole, onde Eólio mantinha os ventos e as tempestades acorrentados. E aquelas montanhas azuis, que se arredondavam no levante, eram as montanhas da Calábria! E o vulcão que se erguia no horizonte sul era o Etna, o selvagem Etna.»
in Viagem ao Centro da Terra, Júlio Verne
Há uns anos – assim não tantos – foi este o meu primeiro contacto com o Stromboli. Mais tarde, numa curtíssima volta de um dia pela Sicília, descobri que era acessível. Prometi lá voltar.
Mais de 1500 dias depois, chegados a Milazzo, porto mais perto das ilhas Eólicas, era tarde. O barco já tinha partido e a viagem demorava umas quatro horas. Restava ver Palermo e voltar no dia seguinte.
Depois de algum sono em Messina, voltámos a Milazzo. Chegados à estação, um tipo nitidamente não-italiano, de barbas compridas e ar meio louco de viajante de muitos quilómetros, parecia meio perdido. Os “taxistas” italianos, com carros perfeitamente comuns de qualquer mortal não profissional do volante, voltaram a vender uma rápida viagem até ao porto, por “módicos” 12 euros. Aproximámo-nos do estrangeiro para dizer que podia evitar a “boleia”. Oitenta e cinco cêntimos chegavam para apanhar um autocarro que passaria dentro de minutos.
Sentados no chão, explicou-nos que ia às Eólicas, mas a Vulcano, a ilha mais próxima da Sicília e a única que permitia a escalada a um vulcão sem guia. Stromboli ficava muito mais longe, demorava muito mais tempo a alcançar e era mais caro. Mas tinha lava, que só seria visível de noite, e uma forma única de vulcão a sair de dentro de água.
Nesse dia, tínhamos de sair da Sicília para abandonar Itália, onde comboios loucos, atrasados e a abarrotar já nos tinham feito perder tempo demais. Vulcano tinha a grande vantagem de permitir passar o dia todo na ilha, a escalar o vulcão e tomar banhos de lama. A custo, por não ter a carga simbólica do Stromboli, foi a solução escolhida. A menos mítica, mas mais racional.
Canadiano a trabalhar na Suiça, o estrangeiro com ar “meio louco” andava há meses a viajar pelo Mediterrâneo – norte de África, Médio Oriente e Sul da Europa. Falava várias línguas e um português (abrasileirado) quase perfeito. Roubado em Nápoles com direito a espancamento pela população local por ter apanhado um dos assaltantes (noticia na CNN e BBC), tinha um orçamento de viagem ainda mais baixo que o nosso. Convenceu-nos a escalar a parte mais difícil do vulcão, por onde não se pagam três euros.
As fotos retractam a paisagem, mas não mostram a água do mar quente que queimava os pés. O Stromboli continuou longe, à espera da terceira ida à Sicília.
Lecce: mais uma cidade italiana.
Aceleras por todo o lado, a buzinar, num trânsito louco, sem regras escritas, onde carros de bebé atravessam cruzamentos na diagonal à frente de automóveis que parecem achar tudo normal. No passeio, em qualquer canto com mais de um metro quadrado, miúdos correm atrás de uma bola, quase sempre laranja, de plástico e a dizer «Super Santos».
Num parágrafo, apresento-vos Nápoles. Uns detestam-na. Outros amam-na. Se para o primeiro sentimento é fácil encontrar explicações (bastam os assaltos), para o segundo a justificação é difícil.
A cidade não tem espaços verdes. Os horários não servem para nada. O trânsito é caótico. As buzinas não param. Os italianos falam alto demais. Famílias inteiras ocupam motoretas, sem qualquer sentido de (in)segurança. Motociclitas têm amenas cavaqueiras ao telemóvel ou falam calmamente com o companheiro do lado. Em qualquer lado, até a peões, a polícia faz operações stop.
Tudo isto é estranho. Mas tudo isto parece ser a verdadeira Itália, que desapareceu do Norte há muitas décadas atrás.
Pompeia: muita história, muita pedra.
Nápoles-Sícilia: Os comboios impossíveis de alcançar.
San Gimignano: Manhatan medieval. Turistas.
Ancona-Bari: no chão.
Matera: Homens das cavernas. Suor.
Sicília: no barco.
Palermo: máfia sem mafiosos.
Vulcano: onde o mar queima os pés.
Stromboli: longe
«”Onde estamos?”, perguntou meu tio, que pareceu muito irritado por ter voltado à superfície da terra. (…) – “Tentemos o italiano”, retomou, e disse nessa língua: “Dove noi siamo?” Nada de o garoto responder. “Vamos, fale!», gritou o meu tio, que começava a ficar nervoso e sacudia o menino pelas orelhas. “Come si noma questa isola?” “Stromboli”, respondeu o pastorzinho, que escapou das mãos de Hans e correu para a planície dos olivais. O Stromboli! Que impacto esse nome inesperado provocava em minha imaginação! Estávamos em pleno Mediterrâneo, no meio do arquipélago eólio, mitológico, na antiga Stronbole, onde Eólio mantinha os ventos e as tempestades acorrentados. E aquelas montanhas azuis, que se arredondavam no levante, eram as montanhas da Calábria! E o vulcão que se erguia no horizonte sul era o Etna, o selvagem Etna.»
in Viagem ao Centro da Terra, Júlio Verne
Há uns anos – assim não tantos – foi este o meu primeiro contacto com o Stromboli. Mais tarde, numa curtíssima volta de um dia pela Sicília, descobri que era acessível. Prometi lá voltar.
Mais de 1500 dias depois, chegados a Milazzo, porto mais perto das ilhas Eólicas, era tarde. O barco já tinha partido e a viagem demorava umas quatro horas. Restava ver Palermo e voltar no dia seguinte.
Depois de algum sono em Messina, voltámos a Milazzo. Chegados à estação, um tipo nitidamente não-italiano, de barbas compridas e ar meio louco de viajante de muitos quilómetros, parecia meio perdido. Os “taxistas” italianos, com carros perfeitamente comuns de qualquer mortal não profissional do volante, voltaram a vender uma rápida viagem até ao porto, por “módicos” 12 euros. Aproximámo-nos do estrangeiro para dizer que podia evitar a “boleia”. Oitenta e cinco cêntimos chegavam para apanhar um autocarro que passaria dentro de minutos.
Sentados no chão, explicou-nos que ia às Eólicas, mas a Vulcano, a ilha mais próxima da Sicília e a única que permitia a escalada a um vulcão sem guia. Stromboli ficava muito mais longe, demorava muito mais tempo a alcançar e era mais caro. Mas tinha lava, que só seria visível de noite, e uma forma única de vulcão a sair de dentro de água.
Nesse dia, tínhamos de sair da Sicília para abandonar Itália, onde comboios loucos, atrasados e a abarrotar já nos tinham feito perder tempo demais. Vulcano tinha a grande vantagem de permitir passar o dia todo na ilha, a escalar o vulcão e tomar banhos de lama. A custo, por não ter a carga simbólica do Stromboli, foi a solução escolhida. A menos mítica, mas mais racional.
Canadiano a trabalhar na Suiça, o estrangeiro com ar “meio louco” andava há meses a viajar pelo Mediterrâneo – norte de África, Médio Oriente e Sul da Europa. Falava várias línguas e um português (abrasileirado) quase perfeito. Roubado em Nápoles com direito a espancamento pela população local por ter apanhado um dos assaltantes (noticia na CNN e BBC), tinha um orçamento de viagem ainda mais baixo que o nosso. Convenceu-nos a escalar a parte mais difícil do vulcão, por onde não se pagam três euros.
As fotos retractam a paisagem, mas não mostram a água do mar quente que queimava os pés. O Stromboli continuou longe, à espera da terceira ida à Sicília.
Lecce: mais uma cidade italiana.
Etiquetas: fotografia, Itália, viagens
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